terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Começar pelo princípio

A política de terra queimada nunca trouxe resultados a ninguém. Os maus exemplos de Benfica, R.Madrid, Liverpool do passado são claros. Mudar sem critério, destruir sem plano de construção apenas agrada a quem acredita que começar do zero é melhor do que começar por detectar o que está mal e apenas agir sobre esse conteúdo.

Parece óbvio que existem medidas urgentes a realizar, mas devem ser feitas com ordem de prioridade e usando recursos existentes (imaginar somas de 20, 30 ou 50 milhões para gastar é um exercício falido à partida). Também devem ser seleccionados timings num projecto a longo termo, querer resolver tudo ao mesmo tempo é desgastante e abre demasiadas hipóteses de errar. Algo parecido com esta receita poderia restituir algum balanço para inverter a tendência de derrota actual:

1/ Despedir Paulo Sérgio e promover uma solução interina

Não há muito a ganhar e não existe mesmo nada a perder. Cada dia com PS no banco é um dia a mais a cavar um fosso entre equipa e adeptos. Um outro treinador, que admito poder ser Couceiro ou Lima conseguirá pelo menos retirar um peso de cima dos jogadores. Só isso poderá ser decisivo para promover melhorias que a equipa nunca conseguiu realizar. E já lá vão 9 meses…se estivesse ao alcance de PS já teriam sido feitas.

2/ Contratar um bom (mas mesmo bom) treinador

Se há verba que será bem gasta é esta. No passado fomos poupadinhos e imaginámos “Mourinhos” ao virar da esquina. Pois bem, a fórmula não funcionou e é altura de contratar alguém que saiba montar equipas, saiba trabalhar esquemas defensivos e atacantes e que não se deixe convencer que por ter menos dinheiro para contratações nos resta o 3º lugar. Felizmente vivemos num mercado global e não precisamos de fechar as vistas a treinadores portugueses. Domingos, Rui Vitória, Machado, Faquirá seriam apenas mais do mesmo e sabem que mais…duvido que aceitem ser triturados como Bento, Carvalhal ou PS. Existem excelentes treinadores na Europa e América Latina que apresentando um projecto sólido desportivamente aceitariam o desafio. Muito do sucesso do futuro passa por esta escolha.

3/ Limpar a folha contratual e salarial do clube

O Sporting tem neste momento mais de 50 atletas profissionais a quem paga ordenado. Mais de uma dezena nunca terá hipóteses de voltar ao plantel. Urge cessar contrato com estes jogadores. Urge vender e emprestar alguns jogadores que acabaram, ou nunca chegaram a iniciar o seu ciclo. Tiago, Hildebrand, Grimi, Abel, Polga, Maniche, Djaló, Saleiro, Tales, Pongolle são pesos mortos num plantel. São 10 jogadores que podem e devem dar o seu lugar a contratações (poucas) e ao regresso de jovens que pelo valor e potencial actual merecem estar no clube. Sejamos realistas, o Sporting terá no máximo 6 ou 7 milhões para gastar (salvo vendas). Este dinheiro dará para o essencial, que na minha opinião é um bom avançado e um bom extremo esquerdo. Golas, João Gonçalves, Nuno Reis, Adrien, André Martins, Wilson Eduardo e Neto são bons miúdos e talvez esteja aqui muito talento (mais barato) por aproveitar. Sei que não serão jogadores para rivalizar com Gaitan, Falcão, Luisão ou Varela, mas não podemos querer ter aquilo que não podemos pagar e nesta altura o Sporting não pode endividar-se mais.

4/ Comprar ou contratar só quando o valor for inquestionável

Tales, Cristiano, Grimi ou Maniche são alguns exemplos de péssimos investimentos. Ninguém sabe o que valerá Grimi ou Cristiano numa outra estrutura profissional, mas nunca serão seguramente figuras de primeira linha. Tem valor, mas não o suficiente, e com outro tipo de dirigismo nunca teriam entrado no clube. Tales foi uma operação de cosmética e Maniche um devaneio de Costinha, ambos são demonstrativos de desnorte. Valdes, NAC, Salomão e Torsiglieri foram boas aquisições e todos os dias comprovam a péssima gestão de PS com o plantel que tem à sua disposição. Mais do que comprar nomes, o Sporting deve comprar soluções e talento, com margem de valorização. A idade, a altura e a proveniência devem ser factores relegados para segundo plano, um bom jogador é um bom jogador e não é por ter 29 anos, 2 metros de altura ou vir do Atlético de Madrid que merece entrar no plantel.
No passado têm nos passado ao lado grandes negócios, Pepe, Jardel, Djalma, Coentrão, Lima são pequenos “casos” recentes em que uma boa gestão desportiva impunha a rápida detecção de talento e mais humildade na negociação com os “chamados” clubes pequenos. Algo não está bem no departamento de scouting e não se explica tudo com a falta de verbas, pois Pongolle, Stojkovic e Purovic foram tudo menos baratos.

5/ Um manager que saiba o que é o futebol

A grande falha de Costinha não foram as contratações, nem sequer a relação com a equipa. O ex-director desportivo falhou sobretudo na estruturação do seu gabinete e na política de comunicação (muito errática e sem critério) que tentou implementar. Impor um modelo à Porto, pode até ter as suas vantagens, mas tem de ser uma acção concertada com todo o clube e não apenas fechada ao balneário. As fugas de informação continuaram, as declarações polémicas de jogadores também e o treinador nunca foi devidamente protegido. Venha quem vier, terá de compreender que estas são áreas vitais para a saúde e respeito pelo clube. Não chega colocar-se ao lado do treinador, tem de se colocar à sua frente, pois é o seu superior hierárquico. Um director de futebol que hostilize a imprensa só revela a sua incapacidade para fazer uso da mesma, a comunicação social deve ser o habitat natural de um manager e a sua principal ferramenta de trabalho. Não deve vir a terreiro falar por tudo e por nada, mas deve intervir persuasivamente sempre que o clube esteja a “perder” o que se chama “good press”. Os mindgames não são exclusivos do treinador.

6/ Preparar um departamento de futebol à séria

As receitas são sobejamente conhecidas, existem vários modelos de organização, mas o Sporting tem uma especificidade que poucos clubes partilham. Tem a melhor Academia do Mundo! Apesar disto, muito pouco tem sido feito para colocar esta vantagem ao serviço da equipa de futebol. A criação da Equipa B já foi uma realidade, alguém entendeu na altura ser demasiado dispendiosa, depois vieram os clubes satélites que também não vingaram, mas tudo isto foi anterior à explosão de valores que começaram a surgir da Academia. Hoje em dia fará mais sentido que nunca o Sporting B. Se já pagamos os ordenados, se temos relvados onde podem jogar, se temos uma estrutura de formação com dezenas de técnicos, o que custará assim tanto? Esta medida aliada a uma optimizada relação entre director desportivo – academia – scouting – equipa B – equipa A – treinador – podem não trazer resultados imediatos, mas é o único caminho a seguir.

7/ Um clube dos Sócios e não da SAD

Acabar com a noção de elite, da cúpula, dos notáveis é mais do que urgente, é essencial. O perigo das oligarquias é que aliena a base da pirâmide, isentando-a de participar activamente. Os sócios do Sporting sentem que o clube é gerido por poucos, os mesmos, os “nobres”. Nada se construirá de forma segura com uma “oposição” que constitui 99,9% dos sócios. Os adeptos tem de sentir que são o propulsor do clube e isso passa por uma comunicação e acções envolventes que não se lembrem só dos adeptos para fazer campanhas de venda de gameboxes e merchandising, que em boa verdade é o que é feito neste momento.
O que significa ser sócio, adepto ou membro de um núcleo tem de ser revisto com natural atenção aos mesmos e não só ao que a SAD pode beneficiar da relação.

8/ Um estádio para o futebol do e para o Sporting

O Estádio de Alvalade está pouco ajustado para ser uma mais valia competitiva, já não mencionando os problemas de rentabilidade financeira. As bancadas, o fosso e o relvado não reflectem uma relação saudável entre clube e adeptos. Sei que provavelmente serão verbas não prioritárias, mas um símbolo de mudança pode ser começar por aqui.

9/ Claques, Associações de Adeptos e Conselho Leonino

Estas estruturas, quer se queira quer não, rodeiam o clube e numa fase de grande inoperância directiva, tem um poder desmesurado. As claques devem ser mais do que organizadas, responsabilizadas pelos actos de violência e pelas má imagem que dão do clube. Porque não fazer com que a AAS tutele e supervisione o comportamento das claques? Está mais que visto que é impossível que se auto-regulem. As claques são parte da história, fazem parte do espectáculo e são importantes no apoio ao clube, mas não podem ser problemas para a gestão do clube. A criminalidade tem de sair destas organizações, doa a quem doer. Quem não se souber comportar dentro de um estádio de forma ordeira, deve ficar à porta do mesmo e isso também é válido para os acessos. Quem paga a factura é sempre a equipa de futebol e isso é algo que os líderes das claques tardam em entender. Se não são capazes de controlar os seus membros, talvez se tenha de repensar a filiação das mesmas. Não existem só direitos quando se pertence a algo.
A AAS é um órgão válido, mas tem ser representativo, quiçá eleito em sufrágio. Não pode ser uma “quintinha” de opiniões pró ou contra-poder. O Conselho Leonino sem poderes vinculados é uma verdadeira camada de “gordura”, símbolo de uma aristocracia caduca. Uma boa direcção não precisa de nenhum “senado”, precisa do apoio dos sócios. Como tal, a não ser que se crie uma necessidade específica para o órgão, acabe-se com ele. Nada de útil ou criativo saiu alguma vez destas cadeiras.

10/ Alianças para quê?

Aliados ao Porto ou ao Benfica, dum lado da barricada ou noutro, o Sporting nunca teve nenhuma vantagem de posicionamento. Ponha-se um ponto final nesta “dança”. O Sporting está do lado do Sporting, quem quiser estar com ele óptimo, quem não quiser…

11/ Finanças
Quando todo este trabalho for feito e estiver solidamente a funcionar, as vitórias surgirão, os adeptos regressarão, vender-se-ão mais jogadores, interessaremos a mais e melhores patrocinadores, ganhar-se-á mais dinheiro na Liga dos Campeões e nos direitos de TV…logo os orçamentos aumentarão. A carroça não pode ser colocada à frente dos bois e os bois no Sporting são neste momento vitelos muito mimados.

Até breve.

5 comentários:

  1. Ricardo Almeida, Vila Real22 de fevereiro de 2011 às 19:12

    Excelente visão. Parabéns. E peço licença para postar no meu Facebook.

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  2. Caro Verdão,
    Sou sócio do nosso glorioso Sporting Clube de Portugal.Há quase 20 anos.Fui na conversa do Roquete e comprei um Lugar de Leão.Foram 2500 € perdidos. Hoje nem "game-boxes" adquiro.Porque gosto de ver futebol.
    Acompanho com muito interesse todos os seus escritos. Porque revelam, além de um amor sem medida pelo nosso SCP, uma visão clara, objectiva e inteligente na caracterização do pântano em que nos atolámos. Porém, ainda mais importante que isso, não se limita a "ver" o que está mal: perconiza uma série de medidas que seriam bem capazes de trazer melhoras ao "doente".Quero aqui afirmar-lhe que subscrevo inteiramente o "plano" que, no seu entender, poderia trazer o Sporting Clube de Portugal de volta. Afinal há leões capazes de pensar. Pena que a legião de candidaturas que se perfilam para "governar" o nosso clube, nada de parecido tenha produzido até ao momento.
    Não pare de pensar, nem de nos dar conhecimento sobre todos os seus pensamentos. Um dia, pode ser que a mensagem chegue junto de algum candidato mais atento.
    Um dia destes,hei-de vir aqui colocar-lhe uma questão engraçada.
    Saudações leoninas

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  3. Muito obrigado Manuel. Espero poder continuar a fazer aquilo que me elogia. Coloque todas as questões que quiser.

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  4. Com as medidas do ponto 3, pretende-se o quê ? Lutar pelo 1º lugar, ou é mesmo só para "Limpar a folha contratual e salarial do clube".

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