quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A viabilidade do Sporting é esta


A indignação que percorre o mundo verde e branco sobre o posicionamento da direcção do Sporting sobre a candidatura ao título é estranha para mim. Não entendo qual é falha de raciocínio, ou o erro de postura. É exactamente o espaço certo para um clube que precisa de ganhar tempo para construir uma equipa. Não uma equipa para o 3º lugar, mas para conquistas reais que passem o imaginário dos defesos cheios de contratações.

Durante anos apostámos na formação por não haver disponibilidade financeira para outro modelo. Os segundos lugares cimentaram uma cultura que dependeu em muito do insucesso do Benfica. Assim que o rival lisboeta apostou forte num modelo desportivo contínuo e em contratações realmente significativas foi fácil ultrapassar o modelo poupado e low profile do Sporting.

Abateu-se o pânico. Um Braga surpreendemente forte acabaria por expor ainda mais a falta de um projecto desportivo sustentável, o risco de sair fora do lote dos 3 grandes foi real. A opção, copiar a mudança de paradigma do Benfica, gastando o que havia e o que não havia em 3 ou 4 nomes sonantes, a imitação porém não foi completa. O rival havia escolhido um treinador com boas épocas no Braga e um longo caminho feito na 1ª e 2ª Liga. O Sporting de Bettencourt decidiu juntar um pouco de Porto à solução optando por treinadores de feeling muito mais do que competência. O feeling foi errado.

Dois modelos, um à Auxerre ou Ajax e outro à Benfica falharam. Por pouco o clube não entrou na insolvência de apoio. Os adeptos viraram costas à equipa, ao estádio, ao pagamento de cotas. Paulo Sérgio e Costinha foram os símbolos de um clube sem ideias ou soluções para acompanhar o ritmo imposto por Porto e Benfica. O presidente demite-se e abre oficialmente o desmoronamento de um Sporting. A oportunidade era boa demais para desaproveitar, na campanha eleitoral foi mais ou menos unânime que o clube teria de enveredar por um novo caminho. Mas qual?

Entre modelos mais arriscados ou mais moderados, foi ponto assente que sem treinadores e jogadores de qualidade seria impossível mudar o clube e devolver a sua aspiração genética para ganhar. Venceu a lista mais “meio termo” com pouca margem para um outro projecto mais ambicioso onde os nomes de Inácio e Van Basten não foram suficientes para contrariar a promessa de Domingos, Freitas e Duque. Mas ficou dado o mote e a auto-exigência para construir uma nova imagem de relação com os adeptos.

E para encontrar os adeptos era preciso encontrar as suas exigências. Depois de vários treinadores “surpresa” a chegada de Domingos era só por si a idealização de uma competência inabalável à luz de 2 épocas no Braga onde quase conquistava um título e uma Liga Europa. Não é um feito ao alcance de quem não tem talento para treinar uma equipa. Assunto arrumado. Agora a equipa.

Herdando um plantel muito oscilante e repleto de não soluções, era óbvio que era necessário desenhar uma nova espinha dorsal. Nas duas épocas anteriores foi por demais evidente que as peças de base eram demasiado irregulares para construir uma nova equipa à sua volta. O dinheiro nunca iria chegar para adquirir estas peças base, ou seja, jogadores que rapidamente levassem o clube para outro patamar. Seriam precisos à volta de 6 a 7 jogadores com valores nunca inferiores a 10 milhões de euros. Embora fosse a solução que mais garantias dava, não estava ao alcance deste Sporting, como não estaria ao alcance da maior parte dos grandes clubes europeus.
Solução? Não tendo condições para montar uma equipa instantaneamente vencedora, optou-se e bem por construir um modelo a prazo, o mesmo é dizer, adquirir jogadores com altas probabilidades de com um ou dois anos de crescimento se tornarem nos tais valores de 10 milhões. Tarefa complicada. Num mercado de transferências basicamente estagnado qualquer movimentação é atentamente seguida pelo universo mundial de agentes e clubes. Não seria fácil lutar com emblemas de maior capacidade financeira para chegar até atletas com margem de valorização apetecíveis.

Mesmo assim, o Sporting conseguiu abastecer-se de jovens com enorme potencial e ainda alguns valores mais experientes que tornaram possível prescindir de alguns jogadores com ordenados inimagináveis para o que davam em campo à equipa. Sem apregoar uma revolução o Sporting fê-la. 14 jogadores contratados e a predisposição para não deixar passar nenhuma oportunidade do mercado são uma notória ambição para ser leões não só no símbolo, mas também na atitude.

Olhando para o que foi conseguido, é evidente que Jeffren ou Capel não são um Hulk ou um Coentrão. Mas são valores que com tempo e espaço em qualquer equipa, poderão adquirir aquilo que os impedia de crescer ainda mais, tempo de jogo. Árias, Turan, Carrilho, Rubio claramente apostas para o futuro. Não são hoje nada do que podem vir a ser daqui a uns anos. Se quisermos ser mais pragmáticos penso que foram definidos 3 tempos de rentabilidade para equipa:

Curto-Prazo:
Schaars, Onyewu, Rodriguez, Luis Aguiar, Bojinov

Médio Prazo
Rinaudo, Boeck, Capel, Jeffren, Wolfswinkel

Longo Prazo:
Rubio, Carrilho, Turan, Árias

Este modelo parece nada ter de especial, mas é bastante mais arriscado que os anteriores. Primeiro porque aposta claramente em jogadores que se sabe à partida não terem a experiência e o ritmo necessários e segundo porque assume que será dado esse tempo. O modelo depende da persistência e teimosia para lidar com o erro natural de quem se está a candidatar a algo mais do que pode assumir no momento.

Para os que estão a pensar nos jovens de qualidade que temos emprestados como algo estranho a este corpo, levo-vos a uma imagem simples: quantos jogadores da cantera do Barcelona, Man Utd ou Juventus conquista um lugar no plantel por época? Um? Dois? E emergem directamente dos juniores? A resposta é raramente, isso esteve ao nível de um Giggs, Messi ou Del Piero, os restantes constroem o seu caminho pelo Barca B, pela equipa de reservas do Manchester, emprestados a um clube do Championship, rodados na Série B.

É esta a única solução para uma Academia que forma todos os anos 6 ou 7 bons valores por ano. Até que surja a equipa B, o Sporting deve de facto criar patamares paralelos de formação de jogadores, o Cercle de Brugges é apenas uma das muitas soluções ao dispor do clube para esse efeito. Djaló é o caso mais emblemático de um jogador que deveria ter tido mais tempo de jogo para crescer e então sim chegar à equipa principal.
Também esta capacidade para segurar os melhores jovens produtos da formação é base de investimento no futuro de uma equipa competitiva. Vender Moutinho e Veloso pelos valores que foram vendidos é uma asneira que tão cedo não deve ser repetida, em primeiro lugar porque baixa a avaliação dos próprios jogadores do clube e cria antecedentes perigosamente baixos para futuras negociações.

Olhando para tudo isto, como é possível a um qualquer ser racional ficar indignado por uma não candidatura ao título? Quando ela é a melhor garantia de viabilidade do nosso projecto e mais é a forma mais lógica de sustentar o clube a longo prazo. Dizer que não somos candidatos ao título é uma verdade que há muito foi adiada de um discurso honesto com os sócios. Ouvir um treinador a dizer que os nossos jogadores são os melhores do mundo a seguir a uma derrota caseira com um Paços de Ferreira, isso sim é matéria de indignação.

Pela minha parte fico satisfeito com a ideia de construção, com objectivos traçados e com a prevalência do talento em serviço de uma ideia válida. Quero ganhar todos os jogos, mas asseguro margem para o erro, a mesma margem que tem de ser vista como o caminho de um clube que não vence um campeonato há 10 anos. Não ganhar ou perder é exactamente o mesmo? Não, não é. Não ganhar é uma circunstância que até pode estar assumida como natural, perder significa levar com uma realidade inesperada e não contabilizada. O Sporting tem perdido muito mais do que não tem ganho.

Até breve.  

2 comentários:

  1. Excelente texto. Pragmático, sensato e pertinente.

    Parabéns.

    saint

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  2. A nossa grandeza está realmente na paixão pelo Sporting...boa analise, e vamos encher Alvalade este Sabado...!!

    SL

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